Amália Safatle
Canavieiras, Bahia. Fazendas de camarão obtêm licenças do Centro de Recursos Ambientais (CRA), órgão estadual de meio ambiente, sem a população ser informada dos impactos dos empreendimentos e sem a realização das audiências públicas previstas em lei. Em 2002, após mortandade de caranguejos e peixes, mais de 2 mil famílias de pescadores entram em risco alimentar. Pescadores, funcionários do Ibama e de ONGs sofrem ameaças de morte por se oporem à instalação das fazendas.
Acupe, distrito de Santo Amaro, Bahia. Pescadores denunciam que a fazenda da Bahia Pesca é um empreendimento do governo do Estado, mas destina investimentos em tecnologia para suprir empresas privadas que usam o local, ao mesmo tempo em que elas financiam as campanhas de prefeitos e vereadores.
Salinas da Margarida, Bahia. Em março de 2005, o pescador Paulo Marinho de Almeida é seqüestrado, torturado e executado. Seu corpo é encontrado dentro de um tanque de camarão da Valença Maricultura.
Caravelas, Bahia. Em outubro de 2005, vem a público um processo de licenciamento da maior fazenda de camarão do Brasil, a Cooperativa dos Criadores de Camarão do Extremo Sul da Bahia (Coopex), que seria implantada sobre manguezais e restingas preservadas do município. Pescadores, marisqueiras, ONGs, órgãos ambientais, movimentos culturais e pesquisadores de universidades protestam e impedem o licenciamento na Justiça.
Estes são exemplos de conflitos, crimes e irregularidas que, segundo a Rede MangueMar Bahia, foram cometidos no estado, devido à expansão da criação de camarão em cativeiro (carcinicultura). E fazem parte do Mapeamento dos Conflitos Socioambientais Relativos à Carcinicultura no Estado da Bahia, que acaba de ser divulgado em Salvador em um seminário promovido pela Superintendência de Recursos Hídricos, ligada à secretaria estadual de Meio Ambiente.
A Rede MangueMar Bahia nasceu da articulação entre comunidades, entidades de base, organizações não-governamentais, pesquisadores de universidades e movimentos sociais, interessados em dar visibilidade às situações de conflito socioambiental motivadas pelo aumento dessa atividade no litoral brasileiro, que se dá principalmente a partir da década de 1990.
Segundo a antropóloga Cecília Mello, colaboradora da rede, as fazendas de camarão implantadas em áreas de manguezal geram graves impactos ambientais, a começar da diminuição do estoque pesqueiro, além de desemprego e vulnerabilidade social para as populações extrativistas da zona costeira da Bahia. Ela afirma que a implantação de fazendas de camarão sobre áreas de preservação permanente e sobre territórios das populações tradicionais - como pescadores, indígenas e quilombolas - tem levado a crescentes violações nos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais.
Ela explica que as fazendas apropriam-se de espaços antes utilizados pela pesca artesanal, canaliza do mangue um caldo rico em nutrientes para alimentar os camarões e devolve para o ambiente uma água poluída com antibióticos, substâncias químicas e restos de ração. Quando esgotado um determinado local, as fazendas passam a explorar outros.
- Por que essa atividade tem se expandido? Porque é um negócio muito lucrativo, pois se apropria de bens públicos, como o espaço e a riqueza dos mangues, e externaliza os custos (transfere o passivo ambiental e social ao público), diz Cecília.
A pesquisa, que conjugou a análise das informações produzidas pelos órgãos ambientais, pelo Ministério Público e por entidades de base, indica que as fazendas de camarão instaladas na Bahia tiveram sua implantação e expansão financiadas pelo BNDES e pelo Banco do Nordeste. O Banco do Nordeste afirma que liberou o financiamento com base em licenças concedidas pelo CRA.
O estudo tem foco nos seis municípios baianos mais impactados pela carcinicultura: Canavieiras, Salinas da Margarida, Acupe - Santo Amaro, Jandaíra, Valença e Caravelas. Mas o problema se mostra recorrente na costa brasileira. Segundo Cecília, no Ceará, por exemplo, somente 20% das fazendas de camarão têm licença ambiental - mostram dados obtidos pelo Ibama a pedido do Ministério Público.
A carcinicultura feita de forma insustentável é uma das principais, mas não única causa da degradação dos mangues. A ocupação imobiliária desordenada e a poluição industrial e residencial são outras. Como resultado, uma área chave para manter estoques pesqueiros - o chamado berçário da vida marinha - é colocado a perder, como se deliberadamente matasse a galinha dos ovos de ouro.
Proteger os manguezais e incentivar a pesca artesanal, na visão de Cecília, são formas de amortecer a desigualdade socioeconômica na zona costeira brasileira.
- No litoral, com a oferta de peixes, não há quem passe fome. É diferente de quem está no sertão nordestino, por exemplo.
Mas com a atividade insustentável praticada por grupos econômicos, isso a cada dia é colocado em risco. No seminário realizado em Salvador, as empresas não foram convidadas a participar. Segundo Cecília, o intuito do evento foi sensibilizar os órgãos públicos, para aumentar a vigilância sobre as atividades econômicas.
Mas peças ficam faltando nesse todo: o envolvimento do setor privado e do consumidor, que pode e deve exigir algum certificado de origem do camarão que compra.
Amália Safatle é jornalista e editora associada da Página 22, revista mensal sobre sustentabilidade, que tem como proposta interligar os fatos econômicos às questões sociais e ambientais.
Fale com Amália Safatle: amalia_s@terra.com.br
Canavieiras, Bahia. Fazendas de camarão obtêm licenças do Centro de Recursos Ambientais (CRA), órgão estadual de meio ambiente, sem a população ser informada dos impactos dos empreendimentos e sem a realização das audiências públicas previstas em lei. Em 2002, após mortandade de caranguejos e peixes, mais de 2 mil famílias de pescadores entram em risco alimentar. Pescadores, funcionários do Ibama e de ONGs sofrem ameaças de morte por se oporem à instalação das fazendas.
Acupe, distrito de Santo Amaro, Bahia. Pescadores denunciam que a fazenda da Bahia Pesca é um empreendimento do governo do Estado, mas destina investimentos em tecnologia para suprir empresas privadas que usam o local, ao mesmo tempo em que elas financiam as campanhas de prefeitos e vereadores.
Salinas da Margarida, Bahia. Em março de 2005, o pescador Paulo Marinho de Almeida é seqüestrado, torturado e executado. Seu corpo é encontrado dentro de um tanque de camarão da Valença Maricultura.
Caravelas, Bahia. Em outubro de 2005, vem a público um processo de licenciamento da maior fazenda de camarão do Brasil, a Cooperativa dos Criadores de Camarão do Extremo Sul da Bahia (Coopex), que seria implantada sobre manguezais e restingas preservadas do município. Pescadores, marisqueiras, ONGs, órgãos ambientais, movimentos culturais e pesquisadores de universidades protestam e impedem o licenciamento na Justiça.
Estes são exemplos de conflitos, crimes e irregularidas que, segundo a Rede MangueMar Bahia, foram cometidos no estado, devido à expansão da criação de camarão em cativeiro (carcinicultura). E fazem parte do Mapeamento dos Conflitos Socioambientais Relativos à Carcinicultura no Estado da Bahia, que acaba de ser divulgado em Salvador em um seminário promovido pela Superintendência de Recursos Hídricos, ligada à secretaria estadual de Meio Ambiente.
A Rede MangueMar Bahia nasceu da articulação entre comunidades, entidades de base, organizações não-governamentais, pesquisadores de universidades e movimentos sociais, interessados em dar visibilidade às situações de conflito socioambiental motivadas pelo aumento dessa atividade no litoral brasileiro, que se dá principalmente a partir da década de 1990.
Segundo a antropóloga Cecília Mello, colaboradora da rede, as fazendas de camarão implantadas em áreas de manguezal geram graves impactos ambientais, a começar da diminuição do estoque pesqueiro, além de desemprego e vulnerabilidade social para as populações extrativistas da zona costeira da Bahia. Ela afirma que a implantação de fazendas de camarão sobre áreas de preservação permanente e sobre territórios das populações tradicionais - como pescadores, indígenas e quilombolas - tem levado a crescentes violações nos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais.
Ela explica que as fazendas apropriam-se de espaços antes utilizados pela pesca artesanal, canaliza do mangue um caldo rico em nutrientes para alimentar os camarões e devolve para o ambiente uma água poluída com antibióticos, substâncias químicas e restos de ração. Quando esgotado um determinado local, as fazendas passam a explorar outros.
- Por que essa atividade tem se expandido? Porque é um negócio muito lucrativo, pois se apropria de bens públicos, como o espaço e a riqueza dos mangues, e externaliza os custos (transfere o passivo ambiental e social ao público), diz Cecília.
A pesquisa, que conjugou a análise das informações produzidas pelos órgãos ambientais, pelo Ministério Público e por entidades de base, indica que as fazendas de camarão instaladas na Bahia tiveram sua implantação e expansão financiadas pelo BNDES e pelo Banco do Nordeste. O Banco do Nordeste afirma que liberou o financiamento com base em licenças concedidas pelo CRA.
O estudo tem foco nos seis municípios baianos mais impactados pela carcinicultura: Canavieiras, Salinas da Margarida, Acupe - Santo Amaro, Jandaíra, Valença e Caravelas. Mas o problema se mostra recorrente na costa brasileira. Segundo Cecília, no Ceará, por exemplo, somente 20% das fazendas de camarão têm licença ambiental - mostram dados obtidos pelo Ibama a pedido do Ministério Público.
A carcinicultura feita de forma insustentável é uma das principais, mas não única causa da degradação dos mangues. A ocupação imobiliária desordenada e a poluição industrial e residencial são outras. Como resultado, uma área chave para manter estoques pesqueiros - o chamado berçário da vida marinha - é colocado a perder, como se deliberadamente matasse a galinha dos ovos de ouro.
Proteger os manguezais e incentivar a pesca artesanal, na visão de Cecília, são formas de amortecer a desigualdade socioeconômica na zona costeira brasileira.
- No litoral, com a oferta de peixes, não há quem passe fome. É diferente de quem está no sertão nordestino, por exemplo.
Mas com a atividade insustentável praticada por grupos econômicos, isso a cada dia é colocado em risco. No seminário realizado em Salvador, as empresas não foram convidadas a participar. Segundo Cecília, o intuito do evento foi sensibilizar os órgãos públicos, para aumentar a vigilância sobre as atividades econômicas.
Mas peças ficam faltando nesse todo: o envolvimento do setor privado e do consumidor, que pode e deve exigir algum certificado de origem do camarão que compra.
Amália Safatle é jornalista e editora associada da Página 22, revista mensal sobre sustentabilidade, que tem como proposta interligar os fatos econômicos às questões sociais e ambientais.
Fale com Amália Safatle: amalia_s@terra.com.br
Um comentário:
Caros,
Postei há pouco em meu blog, um post do Nassif, desmascarando a farsa do PSDB, na armação do Dossiê!
Abraço
Igor
http://alexeievitchromanov.zip.net
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