17/04/2008

Dez anos da rodovia Ilhéus / Itacaré, será que temos o que comemorar?


Há dez anos o estado da Bahia inaugurava a estrada Ilhéus / Itacaré. No blog Acorda Meu Povo do ambientalista Paulo Paiva existem registros importantes deste momento.

Visto por uns como uma grande obra a serviço do progresso, era denunciada por outros como um vetor de degradação social e ambiental de uma região ainda intacta que estava sendo violada sem um planejamento prévio sem estudos de impacto e sem envolvimento das comunidades.

Nunca é tarde lembrar que nosso processo civilizatorio, se é que podemos chamar assim, destruiu noventa e três por cento, de nossa Mata Atlântica originalmente distribuída do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul.

No Sul da Bahia existem ainda áreas importantes destes remanescentes entre elas as matas de Serra Grande e Serra do Condurú.

Alguns anos antes o biólogo ilheense André Mauricio de Carvalho já falecido, liderou uma equipe de pesquisadores em convenio com o Jardim Botânico de Nova York, Royal Botanic Gardens de Londres e Ceplac o resultado foi à descoberta de uma das três áreas com maior biodiversidade do planeta, algo em torno de quatrocentas e setenta espécies vegetais por hectares nas proximidades de Serra Grande.

Nem por isso o governo da Bahia sob o comando de Paulo Souto se preocupou em minimizar ou rever o projeto da estrada, a ordem foi passar por cima. Licitação feita empreiteiras a posto e maquinas derrubando as florestas mais ricas do mundo, este foi o inicio desta estrada.

Neste momento entra em cena um grupo de ambientalistas de Ilhéus, liderados entre outros pelo IESB, sob o comando de Ruy Rocha, botamos a boca no trombone e empunhamos a bandeira da defesa de nossas florestas, chamando atenção para o crime que estava sendo praticado.

Somente após uma grande pressão inclusive do BIRD, Banco Interamericano de Desenvolvimento e financiador da obra junto ao governo baiano, o estado cedeu e a contra gosto aceitou criar o grupo de acompanhamento da obra que foi composto por representantes de diversas instituições dos três municípios envolvidos (Ilhéus, Itacaré e Uruçuca).

Mesmo assim, pelo fato do estado ter realizado as licitações e contratado as empreiteiras, nossas vitórias se restringiram a minimizar impactos, negociar contrapartidas e rever alguns trechos da estrada, entre eles a ladeira de entrada em Itacaré que de forma inteligente foi feita a paralelo em vez do asfalto.

Dez anos depois a estrada é um fato, ajuda a transportar pessoas, mercadorias e consolidar uma indústria turística primária.

Seus impactos negativos porem estão repercutindo até hoje, as margens foram abertas e grandes áreas florestais derrubadas, à especulação imobiliária expulsou os nativos e contaminou as relações de produção e propriedade. Milhares de animais foram e continuam sendo atropelados todos os dias e o traçado mal feito tem provocado diversos acidentes, muitos dos quais fatais.

As comunidades nativas de Itacaré foram devastadas, o tecido social e o patrimônio cultural formado ao longo de séculos de convivência foram rompidos, a chegada de especuladores imobiliários, empresários gananciosos e milhares de jovens “estrangeiros” em busca do paraíso, terminaram por impor novos comportamentos culturais e valores exóticos.

São raríssimos os moradores destas áreas que se beneficiaram com o turismo, pode-se contar aos dedos os nativos de Itacaré que detém alguma empresa ou negócio que prosperou na cidade. Até mesmo os empregos foram ocupados pelos de fora.

Em 2005 um grupo de grandes empresários chegou a contratar uma consultoria internacional a HVS que elaborou o Plano Estratégico Itacaré 2015, este documento apontava para um caminho baseado no desenvolvimento equilibrado e sustentável, um ano depois por pressão política o plano foi abandando.

O modelo que se tornou vigente é turismo de massa, somente viável em escala, preços baixos, turistas duros e pouquíssimo dinheiro em circulação, os pacotes com tudo incluso são pagos em São Paulo ou outro centro emissor, a tendência é a consolidação de um modelo degradante como acontece atualmente em Porto Seguro.

A pior parte já chegou, Itacaré convive hoje as voltas com problemas sociais graves, trafico de drogas, crime organizado, degradação ambiental, destruição do patrimônio histórico e especulação imobiliária.

Comparado com o momento que estamos vivendo em relação ao processo de implantação do chamado Porto Sul, ouve uma evolução enorme, neste caso a comunidade já conquistou seu espaço na comissão de acompanhamento, mas que isso, será implementado o mecanismo de Avaliação Ambiental Estratégica uma ferramenta moderna que, se bem utilizada permitirá antecipar possíveis danos e propor as correções previas.

Ao comemorarmos os dez anos da estrada Ilhéus / Itacaré existem poucos motivos para festas, mas muitas lições para aproveitarmos.


Gerson Marques

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