14/06/2007

Informação na internet reforça a democracia




Para Michael Rogers, “futurista residente” do New York Times quanto mais vozes ouvidas da sociedade, melhor Michael Rogers é um dos principais especialistas no impacto da tecnologia em negócios e na sociedade e é também o “futurista residente” da New York Times Company. Ele participa nesta terça, 12, do MediaOn, um seminário internacional de jornalismo online organizado pelo Itaú Cultural em São Paulo. Em entrevista exclusiva, o especialista discute o futuro da mídia, do jornalismo e a fragilidade da independência editorial.

CartaCapital: A mídia é frequentemente descrita como a última defesa da opinião pública. A mídia tradicional (radio, televisão, impressa) ainda não se encontra tão pulverizada quanto a internet, mas alguns especialistas sustentam que isso é só uma questão de tempo. A pulverização da mídia tradicional seria um avanço? Ou um retrocesso?


Michael Rogers: A tecnologia criou uma oportunidade para um maior número de vozes na mídia – em alguns lugares existem mais estações de radio, TV e jornais do que, digamos, há 20 anos. Mas a internet realmente multiplicou o impacto, barateando o custo da “transmissão” não somente de texto, mas de áudio e vídeo também. Acredito que isso é um avanço, quanto mais vozes ouvidas na sociedade, melhor.


Alguns temem que isso resulte em uma cacofonia de vozes. Outro medo é que a propaganda vai se espalhar por tantos canais que a ponto de não ser mais possível o sustento por meio de anúncios. Mas o que eu vi na internet até agora é que dois “tamanhos” de mídia realmente funcionam: muito grande ou muito pequeno. Ou seja, os sites grandes que alcançam países inteiros – ou até todo o mundo, e depois aqueles pequenos sites que se especializam na cobertura de uma cidade ou um área de interesse bem específica. Os veículos que sofrerão a partir de agora são, na minha opinião, aqueles de médio porte ou de interesse geral. O público destes vai ser consumido pelos sites maiores e menores.


CC: A “morte” do jornal é uma profecia recorrente. Talvez a discussão devesse se centrar no fim do seu formato atual – novas tecnologias permitem telas muito finas e flexíveis que podem mostrar uma página inteira. Os jornais vão evoluir nessa direção ou o papel ainda oferece uma experiência tátil (como a tinta que borra) que é difícil de ser substituída?MR: Nós do grupo de Pesquisa e Desenvolvimento do New York Times olhamos com interesse para a tinta eletrônica (e-ink) e o papel eletrônico (e-paper), mas acreditamos que ainda demore alguns anos – talvez cinco ou mais – para que realmente chegue o substituto do papel. Uma razão é que ainda mostram imagens em preto e branco, e as versões à cor ainda são muito caras para se tornarem comercialmente viáveis. O e-paper e a e-ink vão fazer sentido para livros, que são impressos não sua maioria em preto e branco, e isso deve acontecer mais cedo. Existem bons leitores de livros eletrônicos (e-books) de companhias como a Sony no Japão e a Rex na Europa.


É difícil competir com o papel. Ele é extremamente barato, tem um formato largo, em alta-resolução, é colorido, não precisa de energia e é descartável. Acreditamos que o papel vai co-existir com produtos eletrônicos por alguns anos ainda. O jornal vai mudar – a maioria dos jornais americanos, por exemplo, não lista mais as tabelas com ações e os índices das bolsas porque a internet é muito melhor para esse tipo de notícia. Mas o papel vai continuar como uma das muitas “plataformas” para um jornal – junto com a internet, o celular e talvez versões de televisão também.


CC: Muitos grupos controlados por famílias foram absorvidos por grandes corporações que teriam o lucro como prioridade absoluta. Isso é uma ameaça à liberdade de expressão?


MR: Os jornais “de família” são tão bons quanto as famílias que os controlam – felizmente a maioria destas entende que possui um “bem público”. Essa não é uma idéia que necessariamente existe dentro de companhias de capital aberto que devem responder às pressões do mercado por lucros. Podem existir, no entanto, maneiras de estruturar essas companhias para que elas protejam valores jornalísticos – a Reuters, por exemplo, tem um sistema interno que garante independência editorial. E a família que controla o Wall Street Journal tenta colocar medidas similares em funcionamento antes de permitir uma venda para Rupert Murdoch.


Um dono inteligente – seja ele parte de uma família ou um executivo – deveria saber que o valor de uma companhia de mídia se encontra na independência editorial e que esse equilíbrio não pode ser perturbado. Mas a perspectiva cada vez mais imediata de executivos é a que coloca o lucro na frente de alguns desses valores. Talvez uma queda abrupta no valor de algumas companhias que não possuem independência editorial ensine os respectivos donos o que o público realmente procura.


CC: Da mesma maneira, é possível que os jornais se unam em um só veículo no futuro?


MR: Tenho minhas dúvidas – como disse anteriormente, a tecnologia barateou demais o custo de começar um jornal online. Mas o tamanho também vai ser importante no futuro, então podemos ver uma maior consolidação entre jornais, estações de televisão e sites de internet. Todos nós produziremos uma quantidade cada vez maior de texto, áudio, vídeo e gráficos e usaremos a internet para a distribuição. Em 20 anos um “jornal” e um “canal de tevê” podem se tornar muito parecidos. Algumas dessas operações inevitavelmente irão se fundir para aumentar a audiência e cortar gastos.


CC: O chamado “jornalismo cidadão” está muito difundido e os blogs constituem a única leitura de muitas pessoas. São muito populares, mas essa nova onda do jornalismo é confiável?


MR: Acho que o blog é só mais uma forma de texto possibilitada pela internet, que envolve uma voz mais pessoal, links para outros sites, e a interação com os leitores. Podem ser muito confiáveis – nos Estados Unidos, tanto o New York Times quanto o Washington Post têm muitos blogs, escritos por especialistas e que possuem reportagens exclusivas. Esses produzem jornalismo no sentido tradicional. Mas é claro que um outro aspecto único dos blogs é que são muito fáceis de produzir, então literalmente milhões existem sem qualquer controle editorial. A maioria desses blogs são de opinião e comentários sobre reportagens feitas pela “mídia tradicional”. E assim a confiabilidade deles é extremamente imprevisível.


Os blogs constituem um fenômeno tão novo que acredito que tanto leitores quanto a mídia ainda estão na fase de aprendizado. Os leitores precisam saber julgar sua confiabilidade e mídia precisa entender como incorporar os blogueiros melhores e mais confiaveis em suas publicações. Eles não vão acabar – os mais jovens estão ainda mais dispostos a se exprimir online. Mas no final acho que aqueles que procuram informações concretas ainda exigirão tanto dos blogs quanto da mídia tradicional os fundamentos do jornalismo: marcas e jornalistas em que confiem e uma abordagem profissional que separe a reportagem da opinião.

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