31/05/2007

Cartões-postais emergentes

Conheça as cidades brasileiras que vão estourar -- em número de visitantes e em fluxo de recursos -- nos próximos anos

Por Betina Moura
Revista EXAME

Poucos já ouviram falar da pequena Belmonte, cidade de 18 000 habitantes, que fica no sul da Bahia. O município é apenas uma das rotas de passagem para os turistas que saem de Porto Seguro e querem visitar Santa Cruz de Cabrália, atração da chamada Costa do Descobrimento. Quase um vilarejo, Belmonte tem apenas 180 quartos e vive basicamente da agricultura (cacau, pimenta-do-reino e maracujá). Esse panorama de tranqüilidade -- bem como o anonimato da cidade -- deve mudar radicalmente nos próximos anos.

Cadeias hoteleiras de Espanha, Inglaterra, Suíça e França vão construir cinco resorts no local. São quase 340 milhões de reais em investimentos, 28 vezes o orçamento anual do município, e outros 1 130 quartos. Juntos, esses resorts criarão 600 empregos diretos e outros 1 200 indiretos. Ou seja: 10% de toda a população da cidade estará empregada ou trabalhando graças aos novos empreendimentos. "Estamos nos preparando para uma chacoalhada no perfil econômico do município", diz o secretário de Turismo de Belmonte, Eráclito Lima Santana.


A cada ano, novos destinos e roteiros são "descobertos". São cidades que, de um momento a outro, entram para o mapa do turismo no Brasil -- e dificilmente deixam essa condição.

O ANUARIO DE TURISMO EXAME identificou pelo menos quatro lugares que se transformarão em breve em novas Porto Seguro ou Bonito. Dois critérios foram usados para selecionar essas localidades: fluxo de investimentos em turismo nos próximos três anos (apenas para cidades desconhecidas) e taxas de crescimento no movimento de turistas. O resultado não chegou a surpreender.

Três desses novos pólos ficam na região que mais tem se beneficiado da expansão da atividade turística no Brasil, o Nordeste. Além da baiana Belmonte, fazem parte desse grupo as cidades de Aquiraz, no Ceará, e São Miguel do Gostoso, no Rio Grande do Norte.

O outro integrante dessa nova elite é o município gaúcho de Cambará do Sul, conhecido cenário de produções de televisão, como a minissérie A Casa das Sete Mulheres e a novela O Profeta. "É impressionante a capacidade que o Brasil tem de criar novos destinos a cada ano", diz José Zuquim, presidente da Associação Brasileira das Operadoras de Turismo (Braztoa). "Só precisamos de mais investimentos em marketing."


Boa parte desses recursos tem chegado ao Brasil pela mão de grupos estrangeiros. Dos 150 novos empreendimentos em construção no país, de acordo com dados do anuário EXAME, cerca de 20% pertencem a investidores internacionais. Eles vão para cidades já consagradas como Búzios, no Rio de Janeiro, e Trancoso, no litoral baiano. Mas parte desses recursos migra também para projetos em municípios pouco conhecidos.

Um caso emblemático é o da cearense Aquiraz. Distante 37 quilômetros de Fortaleza, a cidade vai receber uma enxurrada de investimentos nos próximos anos. Só um consórcio luso-brasileiro, liderado pelo Banco Privado Português (BPP), vai desembolsar 750 milhões de reais para construir um complexo hoteleiro por ali. Batizado de Aquiraz Golf & Beach Villas, esse empreendimento prevê oito hotéis, 600 vilas, área comercial, campo de golfe, quadras de tênis e centro hípico.

Quando ficar pronto em 2008, esse será o maior complexo de lazer da América Latina. A competição promete ser acirrada, pois a cidade já tem outros quatro resorts em construção. "Não tenho dúvida de que esses novos empreendimentos vão mudar completamente a região", diz João Rendeiro, presidente do BPP.


Não existe uma fórmula acabada para que determinada cidade ou localidade se torne uma potência do turismo. Às vezes, essa transição ocorre quase por acaso, no ritmo amador da propaganda boca a boca. Foi assim com Búzios, no Rio de Janeiro. Depois que uma estonteante Brigitte Bardot chamou a atenção para as belezas do lugar, grande quantidade de turistas (do Brasil e de fora do país) passou a freqüentar o balneário. Mas esse tipo de fenômeno tende a se tornar cada vez mais raro.

Hoje em dia, um planejamento detalhado ajuda -- e muito -- nesse processo. Em Cambará do Sul, no Rio Grande do Sul, a prefeitura organizou um consórcio com seis cidades vizinhas para impulsionar o turismo na região. A cada mês, elas organizam eventos ressaltando as tradições gaúchas (feiras de gado) e as belezas do lugar (passeios e trilhas pelos cânions Itaimbezinho, Malaraca e Fortaleza). Os resultados são palpáveis. Numa das feiras de gado, realizada no início do ano, quase 300 000 pessoas apareceram na região. Mais de 20 empreendimentos estão sendo construídos e cerca de 25% dos visitantes são estrangeiros, especialmente argentinos. "Até pouco tempo, eles passavam de carro, sem escalas, em direção a Santa Catarina. Hoje, a região já faz parte do roteiro", diz a secretária executiva do consórcio de cidades, Daniela Ligabue.

Com a chegada de novos freqüentadores, os municípios que se transformam em pólos de turismo passam por muitas mudanças. As positivas são o início de um grande fluxo de dinheiro e de empregos para a população local. Mas existem também as negativas. Alguns desses lugares, de uma hora para outra, passam de uma população de menos de 10 000 habitantes para números duas, três ou até quatro vezes maiores que esse.

O resultado é um descompasso entre a infra-estrutura da cidade e as demandas necessárias para receber bem os novos visitantes. Um dos desafios da pequena São Miguel do Gostoso, na Costa das Dunas, no litoral do Rio Grande do Norte, é justamente esse. O preço dos terrenos, por exemplo, já dobrou nos últimos dois anos e dez pousadas foram construídas nos últimos meses. Com apenas 9 000 habitantes, a cidade mantém o clima pacato na maior parte do ano. A tranqüilidade só é quebrada no verão.

Falta agora adequar a rede de saneamento básico, praticamente inexistente hoje, para que a cidade possa receber mais gente -- e mais investimentos.

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